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LEI Nº         11.188,              DE     04      DE       SETEMBRO        DE 2020.

Autor: Poder Executivo

Dispõe sobre a criação da Política Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Estado de Mato Grosso - PEETP e do Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas - CETRAP/MT, e dá outras providências.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MATO GROSSO, tendo em vista o que dispõe o art. 42 da Constituição Estadual, aprova e o Governador do Estado sanciona a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DA POLÍTICA

Art. 1º Fica criada a Política Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em Mato Grosso - PEETP, com a finalidade de estabelecer princípios e diretrizes para o enfrentamento ao crime de tráfico de pessoas no Estado, conforme as normas e instrumentos nacionais e internacionais de direitos humanos e a legislação pátria.

Art. 2º  A Política Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Estado de Mato Grosso é norteada pelos fundamentos do Estado Democrático de Direito, nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e seus Pactos de Direitos Civis, Políticos, Econômicos, Sociais e Culturais, pela legislação pátria aplicável à espécie e, em especial, pelo Decreto Federal nº 5.948, de 26 de outubro de 2006, pelo Decreto Federal nº 5.017, de 12 de março de 2004, pelo Decreto Federal nº 2.740, de 20 de agosto de 1998, e pela Lei Federal nº 13.344, de 6 de outubro de 2016, ou diploma que os venha substituir.

Art. 3º  Para os efeitos desta Lei, entende-se por tráfico de pessoas o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração.

§ 1º  Entende-se por exploração, nos termos a que se refere o caput deste artigo, a prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou os serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos, dentre outras formas de exploração.

§ 2º  Entende-se por rapto, nos termos a que se refere o caput deste artigo, a conduta de privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado.

§ 3º  Entende-se por escravatura ou práticas similares à escravatura:

I - a redução a condição análoga à de escravo, nos termos do art.149-A, II do Código Penal;

II - o casamento servil, nos termos do art. 1º da Convenção Suplementar sobre a Abolição da Escravatura, do Tráfico de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas à Escravatura.

§ 4º  A intermediação, a promoção ou a facilitação do recrutamento, do transporte, da transferência, do alojamento ou do acolhimento de pessoas para fins de exploração também configuram tráfico de pessoas.

§ 5º  O tráfico interno de pessoas é aquele realizado dentro de um mesmo Estado-membro da Federação, ou de um Estado-membro para outro, dentro do território nacional.

§ 6º  O tráfico internacional de pessoas é aquele realizado entre países distintos.

§ 7º  O consentimento dado pela vítima é irrelevante para a configuração do tráfico de pessoas.

CAPÍTULO II

DOS PRINCÍPIOS E DIRETRIZES

Seção I

Princípios

Art. 4º  São princípios norteadores da Política Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de Mato Grosso:

I - respeito à dignidade da pessoa humana;

II - promoção e garantia da cidadania e dos direitos humanos;

III - universalidade, indivisibilidade e interdependência;

IV - não discriminação por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, nacionalidade, atuação profissional, raça, religião, faixa etária, situação migratória ou outro status;

V - transversalidade das dimensões de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, raça e faixa etária nas políticas públicas;

VI - atenção integral às vítimas diretas e indiretas, independentemente de nacionalidade e de colaboração em investigações ou processos judiciais;

VII - proteção integral da criança e do adolescente.

Seção II

Diretrizes Gerais

Art. 5º  São diretrizes gerais da Política Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de Mato Grosso:

I - fortalecimento do pacto federativo, por meio da atuação conjunta e articulada de todas as esferas de governo na prevenção e repressão ao tráfico de pessoas e no atendimento e na reinserção social das vítimas;

II - fomento à cooperação internacional bilateral ou multilateral;

III - articulação com organizações não governamentais, nacionais e internacionais;

IV - estruturação de rede de enfrentamento ao tráfico de pessoas, envolvendo todas as esferas de governo e organizações da sociedade civil;

V - fortalecimento da atuação nas regiões de fronteira, portos, aeroportos, rodovias, estações rodoviárias e ferroviárias e demais áreas de incidência;

VI - verificação da condição de vítima e respectiva proteção e atendimento, no exterior e em território nacional, bem como a sua reinserção social;

VII - incentivo e realização de pesquisas, considerando as diversidades regionais, organização e compartilhamento de dados, tais como a condição socioeconômica, questões de gênero, identidade de gênero, raça, cor, religião, descendência, origem étnica, idade, sexo ou orientação sexual;

VIII - formação e capacitação de profissionais para o enfrentamento ao tráfico de pessoas, buscando a punição dos responsáveis e o atendimento e a reinserção social das vítimas;

IX - incentivo à participação da sociedade civil no controle social das políticas públicas na área de enfrentamento ao tráfico de pessoas;

X -incentivo à participação dos órgãos de classe e conselhos profissionais, no âmbito nacional, estadual e municipal, na discussão sobre tráfico de pessoas;

XI - garantia de acesso amplo e adequado a informações em diferentes mídias e estabelecimento de canais de diálogo entre o Estado, sociedade e meios de comunicação, referentes ao enfrentamento ao tráfico de pessoas em âmbito internacional, nacional, estadual e municipal;

XII - instituição de políticas públicas de prevenção e repressão ao tráfico de pessoas e atenção às vítimas por meio da integração de ações de política social, de educação, de saúde, de promoção e de defesa dos direitos humanos, de promoção da igualdade racial e de gênero, de justiça e de segurança pública;

XIII - análise das especificidades das diversas regiões, urbano e rural, observando os seus desequilíbrios, diferenças de renda, de gênero, de raça, de cor, de descendência, de origem étnica e as necessidades das pessoas com deficiência, associando-as às políticas sociais universais e às políticas especialmente voltadas aos grupos em situação de vulnerabilidade ou exclusão.

Seção III

Diretrizes Específicas

Art. 6º  São diretrizes específicas de prevenção ao tráfico de pessoas:

I - implementação de medidas preventivas nas políticas públicas, de maneira integrada, articulada, sistêmica e intersetorial, nas áreas de saúde, educação, cultura, infância e juventude, trabalho, esporte, segurança, justiça, turismo, assistência social, desenvolvimento rural, transporte, habitação, direitos humanos, dentre outras;

II - realização e apoio de campanhas socioeducativas e de sensibilização nos âmbitos internacional, nacional, regional e local, considerando as diferentes realidades e linguagens, em parceria com os entes federativos, a sociedade civil e os órgãos de classe;

III - monitoramento e avaliação de campanhas com a participação da sociedade civil;

IV - apoio à mobilização social e ao fortalecimento da sociedade civil;

V - fortalecimento dos projetos já existentes e fomento à criação de novos projetos de prevenção ao tráfico de pessoas;

VI - inclusão da temática do tráfico de pessoas nos currículos de formação dos profissionais das áreas específicas.

Art. 7º  São diretrizes específicas de repressão ao tráfico de pessoas e de responsabilização de seus autores:

I - cooperação entre órgãos policiais nacionais e internacionais;

II - cooperação jurídica internacional;

III - sigilo dos procedimentos judiciais e administrativos nos termos da lei;

IV - integração com políticas e ações de repressão e responsabilização dos autores de crimes correlatos;

V - sensibilização dos profissionais da área da justiça e segurança pública no atendimento às vítimas do tráfico de pessoas.

Art. 8º  São diretrizes de atenção às vítimas do tráfico de pessoas:

I - proteção e assistência jurídica, social e de saúde às vítimas diretas e indiretas de tráfico de pessoas;

II - acolhimento em abrigo provisório das vítimas de tráfico de pessoas;

III - reinserção social com a garantia de acesso à educação, à cultura, à formação profissional e ao trabalho às vítimas de tráfico de pessoas;

IV - reinserção familiar e comunitária de crianças e adolescentes vítimas de tráfico de pessoas;

V - atenção às necessidades específicas das vítimas, com especial atenção a questões de gênero, identidade de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, nacionalidade, raça, cor, religião, faixa etária, situação migratória ou atuação profissional;

VI - proteção da intimidade e da identidade das vítimas de tráfico de pessoas;

VII - levantamento, mapeamento, atualização e divulgação de informações sobre instituições governamentais e não governamentais situadas no Estado de Mato Grosso, no Brasil e no exterior que prestam assistência às vítimas de tráfico de pessoas.

Art. 9º  A Política Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de Mato Grosso assenta-se, em sua concepção de segurança pública, sobre os seguintes valores:

I - articulação entre segurança pública e direitos humanos, estabelecendo como meta principal a garantia do direito à vida e à dignidade da pessoa humana;

II - compatibilização da qualificação da dimensão repressiva e coercitiva, baseada na incorporação de inteligência, informação, tecnologia e gestão, com forte ênfase sobre os aspectos de prevenção social;

III - transversalidade e integralidade das ações de segurança pública, com a possibilidade de serem executadas por todas as Secretarias de Estado;

IV - incorporação, quando possível, de mecanismos de gestão, monitoramento e avaliação das políticas públicas de segurança;

V - participação e monitoramento social, desde a formulação das estratégias até a execução das ações de segurança pública.

CAPÍTULO III

DO COMITÊ

Art. 10  Fica ratificada a criação do Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Mato Grosso - CETRAP/MT.

Parágrafo único  O Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas é vinculado à Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania, ou à Pasta equivalente a Direitos Humanos.

Art. 11  O Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas é um órgão deliberativo, normativo, monitorador, fiscalizador e avaliador das políticas que visem o enfrentamento ao tráfico de pessoas no Estado de Mato Grosso.

Art. 12  Compete ao CETRAP/MT:

I - formular, monitorar e fiscalizar as políticas de prevenção e enfrentamento ao tráfico de pessoas;

II - coordenar as ações de prevenção e enfrentamento ao tráfico de pessoas;

III - propor, acompanhar e avaliar os projetos de cooperação técnica firmada entre o Governo do Estado e os organismos nacionais, estaduais e internacionais nessa temática;

IV - estimular e promover a realização de estudos, pesquisas e eventos que incentivem o debate sobre o tema tráfico de pessoas;

V - promover capacitações e incentivar realizações de campanhas sobre o tema;

VI - supervisionar e apoiar o funcionamento e as atividades do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas;

VII - monitorar e acompanhar as denúncias e casos reportados ao Poder Público relacionados ao tráfico de pessoas em Mato Grosso;

VIII - instalar comissões e grupos de trabalhos nas formas previstas no regimento;

IX - elaborar e apresentar, anualmente, à sociedade e aos Chefes do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário do Estado de Mato Grosso relatório circunstanciado das atividades desenvolvidas no período;

X - elaborar e aprovar o seu regimento interno.

Art. 13  O Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas é composto por representantes da sociedade civil e pelo poder público, com a seguinte composição:

I - Casa Civil;

II - Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania - SETASC;

III - Secretaria de Estado de Educação - SEDUC;

IV - Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer - SECEL;

V - Secretaria de Estado de Saúde - SES;

VI - Secretaria de Estado de Segurança Pública - SESP;

VII - Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão - SEPLAG;

VIII - Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso - TJ;

IX - Ministério Público do Estado de Mato Grosso - MPE;

X - Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso - DPE;

XI - Polícia Judiciária Civil - PJC;

XII - Polícia Militar - PM;

XIII - Procuradoria-Geral do Estado - PGE;

XIV - Universidade Estadual de Mato Grosso - UNEMAT;

XV - Assembleia Legislativa de Mato Grosso - ALMT;

XVI - por até 15 (quinze) representantes de entidades não governamentais que possuam no mínimo 02 (dois) anos de atividades comprovadamente relacionadas ao enfrentamento do tráfico de pessoas, ou a temas correlatos, voltados à promoção e defesa dos direitos humanos.

Parágrafo único  Cada entidade ou instituição indicará um(a) titular e um(a) suplente para representá-lo(a) no Pleno do CETRAP/MT, devendo este(a) ter poder de decisão, no âmbito de cada Secretaria, órgão ou entidade.

Art. 14  O Comitê será composto também por representantes e respectivos suplentes dos órgãos elencados nos incisos abaixo, que não integram a Administração Pública Estadual:

I - Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região - TRT;

II - Ministério Público Federal - MPF;

III - Ministério Público do Trabalho - MPT;

IV - Defensoria Pública da União - DPU;

V - Agência Brasileira de Inteligência - ABIN;

VI - Polícia Federal - PF;

VII - Polícia Rodoviária Federal - PRF;

VIII - Superintendência Regional do Trabalho - SRT;

IX - Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT;

X - Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO.

Art. 15  As entidades não governamentais, em funcionamento a pelo menos dois anos, reunir-se-ão em assembleias para indicação de seus representantes e posterior eleição, nos termos de regulamento próprio.

§ 1º  Os representantes serão indicados para mandato de 3 (três) anos, admitindo-se recondução.

§ 2º  O exercício da função de conselheiro (a), suplente ou titular, é considerado de interesse público relevante e não será remunerado.

Art. 16  O CETRAP/MT será dirigido por uma coordenação tripartite, eleita por seus pares, nos termos do regimento interno do Comitê de Estado de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.

Art. 17  O CETRAP/MT contará com uma Secretaria-Executiva para prestar o suporte técnico, logístico, administrativo e operacional às competências e finalidade do Comitê.

Art. 18  Os servidores da Secretaria-Executiva do CETRAP/MT serão disponibilizados pela Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania e também de outras secretarias ou órgãos, mediante requisição ou termo de cooperação.

Art. 19  A Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania propiciará ao Comitê as condições necessárias ao seu funcionamento, disponibilizando local para instalação e toda a infraestrutura e a logística necessária à constituição do órgão.

Art. 20  As despesas decorrentes da execução dessa Lei correrão à conta de dotações orçamentárias próprias.

Art. 21  Ficam revogadas as disposições em contrário, em especial o Decreto nº 990, de 10 de fevereiro de 2012.

Art. 22  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio Paiaguás, em Cuiabá, 04 de setembro de 2020, 199º da Independência e 132º da República.